A industrialização por encomenda é um processo pelo qual o encomendante envia insumos de sua propriedade a um industrializador para que este execute uma etapa de industrialização. Após a conclusão do serviço, o produto é devolvido ao encomendante, que pode optar por revender o item a terceiros. Esse cenário, aparentemente simples, tem gerado intensos debates quanto à tributação incidente sobre a operação: ICMS ou ISS?
A Controvérsia Tributária
A controvérsia tributária reside na natureza híbrida da operação, que combina aspectos de prestação de serviços e de circulação de mercadorias. A solução do impasse depende de dois fatores principais:
- A continuidade no ciclo produtivo: Considera-se essencial o fato de que tanto os insumos quanto o produto final permanecem no ciclo produtivo e se destinam à comercialização ou industrialização subsequente. Nesse caso, prevaleceria a incidência do ICMS.
- A previsão na lista de serviços do ISS: Caso o serviço executado conste da lista anexa à Lei Complementar 116/03, o ISS seria o tributo aplicável.
Esse embate está longe de ser meramente acadêmico, pois o enquadramento correto da operação impacta diretamente a carga tributária das empresas e o planejamento fiscal.
O Posicionamento do STJ
Historicamente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) inclinava-se a favor da incidência do ISS nas operações de industrialização por encomenda. Em 2009, reafirmou esse entendimento no julgamento do Tema 91, que culminou na Súmula 196: “Incide ISS sobre a prestação de serviços de composição gráfica, personalizadas e sob encomenda, ainda que envolva o fornecimento de mercadorias”.
Contudo, em 2021, o STJ promoveu uma reviravolta ao alinhar-se à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), indicando que a continuidade no ciclo produtivo deveria prevalecer. Esse alinhamento é evidenciado no julgamento do AgInt no REsp 1.721.841, onde o tribunal adotou postura mais favorável à incidência do ICMS.
A Intervenção do STF
O STF desempenhou papel decisivo no direcionamento desse debate. Em 2011, na ADI 4.389, a Corte suspendeu a cobrança de ISS sobre industrialização por encomenda de embalagens destinadas à integração ou utilização direta em processos de industrialização ou circulação de mercadorias. Embora o mérito da ação tenha se tornado prejudicado, a alteração do item 13.5 da lista do ISS consolidou o entendimento de que essas operações estariam fora do alcance do ISS.
Além disso, no julgamento do Tema 816, a Corte caminha para declarar inconstitucional a incidência do ISS sobre operações que configuram etapas intermediárias no ciclo produtivo de mercadorias. Esse entendimento reforça a tese de que o ICMS é o tributo aplicável quando o objeto da industrialização destina-se à comercialização ou industrialização subsequente.
Reflexos e Perspectivas
A evolução da jurisprudência aponta para a prevalência do ICMS nas operações de industrialização por encomenda quando a atividade realizada integra o ciclo produtivo. Esse entendimento, ainda que não pacificado, reduz a insegurança jurídica para empresas que dependem dessa modalidade produtiva.
Todavia, é indispensável acompanhar os desdobramentos no STF, especialmente no julgamento do Tema 816, cuja conclusão poderá consolidar o entendimento sobre a tributação aplicável. Enquanto isso, o planejamento tributário deve considerar os riscos e oportunidades relacionados a essa matéria.
Conclusão
A disputa entre ICMS e ISS nas operações de industrialização por encomenda reflete a complexidade do sistema tributário brasileiro. Apesar de avanços na uniformização jurisprudencial, ainda há espaço para dúvidas e litígios.
Nós da Moisés Freire Advocacia estamos prontos para monitorar atentamente as decisões judiciais e adaptar sua empresa às mudanças legislativas e interpretativas que possam impactar suas operações.