Planejamento Sucessório: Estratégias Eficientes para um Cenário de Incertezas Tributárias

O Ministro Gilmar Mendes, em recente decisão proferida nos Autos do RE 1.425.609/GO, deu provimento a um recurso apresentado pela União para reformar um acórdão proferido pelo TRF da 1ª Região. Reconheceu que não haveria no caso bitributação ou invasão de competência tributária em decorrência da cobrança de ganho de capital nas transferências de bens, fato já tributável pelo ITCD, de competência dos Estados. Afirmando o Ministro que: “(…) a tributação do ganho de capital nas transferências de bens do de cujus ou do doador configura acréscimo patrimonial sujeito à incidência do imposto de renda, não se havendo de cogitar de bitributação ou de invasão de competência tributária”.

Em posterior decisão, agora em Agravo Regimental no Recurso Extraordinário, o Ministro Gilmar Mendes manteve sua decisão inicial, fundamentando que: “(…) o §1º do art. 23 da Lei 9.532/1997 apenas explicitou o momento de apuração do acréscimo patrimonial, não se tratando de inovação acerca do fato gerador do imposto de renda. Nesses termos, entendo que não se trata de tributação da herança ou doação, mas de definição do momento da tributação do ganho de capital recebido. Com efeito, esta Corte assentou não haver vício de inconstitucionalidade quando a legislação ordinária ‘encerra explicitação do fato gerador, alusivo ao imposto de renda, fixado no art. 43 do CTN’ (RE 200.972, Rel. Min. Marco Aurélio, Segunda Turma, DJ 21.2.1997).” Concluindo, logo em seguida, que: “Conforme consignado na decisão anterior, o § 1º do art. 23 da Lei 9.532/1997 apenas registrou o momento em que se firma o acréscimo no patrimônio, não configurando, portanto, um fato novo que geraria imposto de renda.

Fato é que o posicionamento adotado pelo Ministro Gilmar Mendes não é um entendimento pacificado na Corte, conforme podemos apreender da leitura do voto dissidente relatado pelo Ministro Dias Toffoli, que concluiu que o imposto de renda não poderia “(…) incidir sobre essa mesma realidade, sob pena de ferir a distribuição de competências realizada pela Constituição Federal, a pessoalidade e a capacidade contributiva e provocar vedada a bitributação”.

Observem que as decisões divergentes entre as Turmas do STF ao deliberar sobre a constitucionalidade da incidência conjunta do IR e do ITCMD sobre as mesmas bases patrimoniais destacam a falta de consenso entre os integrantes da Corte e impõem ao contribuinte um ambiente de indiscutível insegurança jurídica.

Esse cenário reflete a necessidade de maior preparação e estruturação do planejamento sucessório, a fim de mitigar eventuais riscos decorrentes da falta de uniformidade na forma como os tribunais, principalmente o STF, se posicionam acerca de temas tão controversos. As decisões da Corte não apenas moldam a aplicação das leis tributárias, mas também têm implicações diretas na eficácia das estratégias de planejamento sucessório. Por exemplo:

Implicações Financeiras: A tributação do ganho de capital na transmissão de bens pode significar um custo adicional significativo para os herdeiros. Isso pode afetar a liquidez dos beneficiários, que podem precisar arcar com impostos substanciais no momento da transferência patrimonial.

Necessidade de Reavaliação de Estratégias: Famílias que planejam a transferência de seu patrimônio precisarão considerar os impactos tributários dessas transmissões. Estratégias como doações em vida, uso de trustes ou a formação de holdings familiares para gerenciamento de patrimônio podem necessitar de revisão e ajustes para otimizar a carga tributária.

Decisões de Investimento e Liquidez: Com a potencial carga tributária aumentada na transferência de bens, as famílias podem precisar planejar com antecedência para garantir que haja liquidez suficiente para cobrir os impostos devidos. Isso pode influenciar decisões sobre quais ativos manter ou vender e quando.

Implicações Legais e Desafios: Como a aplicação do imposto sobre ganho de capital em transmissões por herança ou doação é uma área complexa e tecnicamente desafiadora, pode haver espaço para disputas legais e necessidade de interpretação judicial em casos específicos.

Vale pontuar que o Planejamento Sucessório, ao contrário do senso comum, não se presta apenas a ser um processo de transferência ordenada de patrimônio, mas é também um eficiente mecanismo de proteção contra possíveis prejuízos financeiros e legais decorrentes de mudanças na interpretação das leis tributárias. Das várias estratégias possíveis, como a formação de holdings familiares, uso de testamentos, composição de seguros de vida e planos de previdência são essenciais para mitigar riscos e assegurar que a vontade do indivíduo seja respeitada após sua morte.

Além disso, o planejamento sucessório pode servir como mecanismo para apaziguar conflitos familiares, assegurando que a distribuição dos bens ocorra de forma a minimizar disputas entre os herdeiros. A especificação clara de como os bens devem ser distribuídos, quem deve assumir a gestão de negócios familiares e como eventuais débitos e créditos devem ser tratados pode reduzir significativamente o potencial de litígios que frequentemente surgem em processos de sucessão.

Em conclusão, o planejamento sucessório vai além da simples preparação de documentos legais. É uma prática abrangente que requer uma compreensão detalhada das leis tributárias, das decisões judiciais relevantes e das necessidades e desejos individuais dos clientes. Com as decisões recentes do STF sobre a tributação de heranças e doações, torna-se ainda mais claro que um planejamento bem-feito é indispensável para a segurança financeira e a paz de espírito dos envolvidos.

Fonte: https://www.conjur.com.br/2024-jun-10/stf-valida-cobranca-de-ir-em-conjunto-com-itcmd-sobre-transferencia-de-imovel-de-heranca/

Sobre o(a) Autor(a)

Daniel Cerqueira

Sócio Coordenador da Área Societária do Moises Freire Advocacia, com experiência e atuação em Direito Societário e Governança Corporativa, atua com foco nas reestruturações societárias, operações de transformação, incorporação, fusão e cisão de Sociedades, formulação e revisão de documentos e atos societários, estruturação e/ou aprimoramento de processos de Governança Corporativa.

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