USUCAPIÃO: UMA SOLUÇÃO PARA REGULARIZAR E CRIAR UMA MATRÍCULA INDIVIDUAL À PROPRIEDADE

Uma questão frequente no setor imobiliário é a construção de várias casas em um único lote. Em terrenos que possuem apenas uma matrícula, pode-se encontrar três, quatro ou mais casas, cada uma servindo de residência para diferentes pessoas ou famílias. Isso geralmente ocorre em situações de herança, quando os beneficiários decidem construir no mesmo local, mesmo sem dividir formalmente a matrícula. Em outras ocasiões, é o próprio comprador do terreno que opta por edificar várias unidades, que acabam sendo vendidas ou ocupadas por filhos, irmãos e outros. Com o tempo, devido ao falecimento do proprietário original, ao desejo dos herdeiros ou à vontade dos ocupantes, surge a necessidade de individualizar as áreas. Isso é feito para obter matrículas separadas, assegurar a propriedade plena da construção, ou possibilitar a venda, entre outras motivações.

Para dividir um lote e regularizar construções criando matrículas individuais, podem-se utilizar alguns procedimentos jurídicos. O método mais tradicional é o DESDOBRO, que transforma um lote urbano em dois ou mais lotes menores. Este processo é regulamentado pela Lei 6.766/79, que trata do parcelamento do solo urbano. No entanto, esse procedimento depende das exigências legais de cada município, especialmente em relação ao tamanho e índices urbanísticos das construções. Muitas vezes, é um processo bastante burocrático e demorado, dependendo das regras municipais.

Outra alternativa legal para dividir terrenos e individualizar construções, criando matrículas individuais, foi estabelecida em 2017 com a Lei do CONDOMÍNIO URBANO SIMPLES, através da Lei 13.465 (REURB), especificamente nos artigos 61 e 63. Nesse caso, cria-se um condomínio sobre o terreno, combinando áreas privadas (construções individuais) e áreas comuns. Assim como no desdobro, exige-se a apresentação de um projeto que deve ser elaborado, apresentado e aprovado perante os órgãos públicos competentes, além de outras exigências.

O conceito de usucapião de imóveis está descrito nos artigos 1.238 a 1.244 do Código Civil, além de normas específicas, como a Lei 10.257/2001. Esse instituto permite a aquisição da propriedade de um imóvel devido ao uso contínuo por um determinado período. Para aplicá-lo, é necessário cumprir certos requisitos, tais como o “comportamento de proprietário” (animus domini) por parte do possuidor; a inexistência de oposição de terceiros; e a posse sem interrupção por um tempo mínimo estabelecido por lei. Outros requisitos podem variar conforme o tipo de usucapião em questão.

Embora exista alguma divergência doutrinária, a Ação Judicial de Usucapião não só pode ser utilizada para adquirir propriedade, mas também para regularizar um bem, incluindo o “desmembramento” ou “desdobro” de parte de um lote. Neste contexto, a usucapião pode ser aplicada apenas à área do terreno onde o interessado possui sua construção e posse, de modo a delimitar sua área e obter uma matrícula própria.

Este procedimento (“desdobro” por usucapião) pode ser aplicado, por exemplo, quando há indisponibilidade ou recusa por parte dos demais ocupantes do terreno — por diversas razões — de cooperar na divisão do lote. Desta forma, o interessado pode individualmente regularizar sua área/construção, obtendo uma matrícula individual e solucionando seu problema.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal já decidiram que as leis municipais de zoneamento não podem impedir a usucapião de parte de um terreno, mesmo que a área em questão seja menor que o “lote padrão” do município. Em um julgamento de recurso especial repetitivo (Tema 1.025), a Segunda Seção do STJ, na pessoa do Ministro Dr. Moura Ribeiro, assim se pronunciou:

“Não há, portanto, como negar o direito à usucapião sob o pretexto de que o imóvel está inserido em loteamento irregular, porque o direito de propriedade declarado pela sentença (dimensão jurídica) não se confunde com a certificação e a publicidade que emergem do registro (dimensão registrária) ou com a regularidade urbanística da ocupação levada a efeito (dimensão urbanística)”.

Neste aspecto, é importante destacar que o processo judicial de usucapião pode facilitar mais do que o procedimento administrativo de desdobro.

De qualquer maneira, como ocorre na maioria dos casos de usucapião, será necessário elaborar um memorial descritivo da área a ser adquirida por usucapião para instrução judicial, além de cumprir outros requisitos legais.

Vale ressaltar que muitas pessoas, construtoras e empresários utilizam o instituto da usucapião como meio de regularizar imóveis, incluindo a regularização de propriedades próprias. Nesse contexto, a seguir está a ementa de um julgamento exemplificador do Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial nº 292.356/SP, relatado pelo estimado e saudoso Ministro Dr. Menezes Direito:

Usucapião. Autores com títulos de domínio. Dificuldade de unificação e reconstituição. 1. É cabível a ação de usucapião por titular de domínio que encontra dificuldade, em razão de circunstância ponderável, para unificar as transcrições ou precisar área adquirida escrituralmente. 2. Recurso especial conhecido e provido. (REsp n. 292.356/SP, relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Terceira Turma, julgado em 27/8/2001, DJ de 8/10/2001, 213.).

Como em qualquer questão imobiliária, especialmente quando se trata de buscar o “desmembramento” do lote via usucapião, é aconselhável que o interessado procure a orientação especializada para que as ações sejam tomadas de forma segura, evitando problemas futuros.

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