Mudanças no contencioso administrativo pela Reforma Tributária

DESAFIOS SIGNIFICATIVOS

A reforma tributária proposta pela Emenda Constitucional nº 132/2023 (EC 132) trará significativas mudanças no contencioso administrativo tributário, especialmente no que diz respeito ao Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e à Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Essas mudanças afetarão diretamente os órgãos julgadores administrativos, como o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e as Delegacias de Julgamento da Receita Federal (DRJs).

1. Vinculação aos Precedentes e Novas Regras

Historicamente, os órgãos julgadores administrativos, como o Carf e as DRJs, têm sido vinculados aos precedentes qualificados dos tribunais superiores (STJ e STF), conforme estabelecido pelo artigo 98 do Regimento Interno do Carf e outras normas pertinentes. Essa vinculação visa garantir a isonomia e a segurança jurídica nas decisões administrativas tributárias.

Com a introdução do IBS e da CBS, que são impostos cujas normas gerais serão idênticas, mas mantendo sua autonomia de arrecadação e gestão, a proposta inicial era unificar o contencioso administrativo tributário para ambos os tributos. Entretanto, o cenário atual aponta para a manutenção de contenciosos administrativos distintos: um para o IBS e outro para a CBS, com diferentes instâncias de julgamento e possíveis divergências interpretativas.

2. Impactos da Reforma no Contencioso Administrativo

2.1. Contencioso Administrativo do IBS: Criado pelo PLP 108/2024, este contencioso será responsável por julgar litígios envolvendo o IBS. Ele seguirá princípios semelhantes aos do Carf, como o contraditório, ampla defesa e sistema paritário de representação de julgadores.

2. 2. Contencioso Administrativo da CBS: A CBS será julgada pela 3ª Seção do Carf, substituindo os julgamentos atualmente realizados para o PIS e a Cofins. Isso sugere uma continuidade no modelo de contencioso administrativo já estabelecido para outros tributos federais.

2.3. Vinculação aos Precedentes e ao Comitê de Harmonização: O PLP 108/2024 estabelece que as decisões do Comitê de Harmonização das Administrações Tributárias terão caráter vinculante para os órgãos julgadores administrativos do IBS e da CBS. Isso significa que as decisões do comitê serão obrigatórias para esses órgãos, visando harmonizar a interpretação da legislação tributária.

3. Críticas e Desafios

A proposta de vinculação das decisões do comitê de harmonização gera críticas significativas. Há preocupações com a perda de autonomia dos órgãos julgadores administrativos, como o Carf, que tradicionalmente exercem um papel de controle interno sobre os atos normativos da administração tributária. Além disso, a composição do comitê, exclusivamente por representantes da RFB, da Procuradoria e do Comitê Gestor, levanta questões sobre a paridade de julgamento e a inclusão dos contribuintes no processo decisório.

4. Conclusão

Essa dualidade institucional criada pelo PLP 108/2024 pode resultar em divergências interpretativas não apenas entre os contenciosos administrativos, mas também na elaboração de normas infralegais pelo Comitê Gestor do IBS. Para mitigar essas divergências, propõe-se o Comitê de Harmonização das Administrações Tributárias e o Fórum de Harmonização Jurídica das Procuradorias, cujo papel inclui a uniformização normativa e a prevenção de litígios.

Contudo, surgem críticas à vinculação do contencioso administrativo ao Comitê, questionando sua eficácia frente à independência jurisdicional do Carf e a representação equilibrada dos contribuintes.

Além disso, a vinculação dos órgãos julgadores às decisões do Comitê pode restringir a capacidade do Carf de controlar a legalidade das normas aplicáveis à CBS. Esta perspectiva levanta preocupações quanto à coerência do sistema jurídico e à possibilidade de litígios prolongados, contrariando o princípio da legalidade.

Em suma, a proposta de reforma do processo administrativo tributário precisa ser mais criteriosa em seus detalhes para evitar potenciais conflitos e assegurar a segurança jurídica necessária ao ambiente de negócios. A harmonização de interpretações entre as partes envolvidas é crucial para a implementação bem-sucedida do IBS e da CBS, buscando sempre equilibrar os interesses públicos e privados.

Sobre o(a) Autor(a)

Fernando de Melo Monteiro Filho

Pós graduado em Direito da Economia e da Empresa pela FGV, pós-graduado em Direito Tributário pela PUC-MG, graduado em Direito pela PUC-MG e em Engenharia Mecânica também pela PUC-MG.

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