A Tributação da Mineração sob o Novo Modelo da Reforma Tributária

A Reforma Tributária, promulgada em janeiro de 2025, introduz significativas mudanças no sistema de tributação sobre o consumo no Brasil. Entre os setores fortemente impactados está a mineração — atividade estratégica para a economia nacional, responsável por cerca de 50% do superávit da balança comercial e base essencial de cadeias produtivas como a da construção civil, siderurgia, indústria de veículos e eletrônicos. Com mais de 55 tipos de minerais e cerca de 9.400 minas em operação, o setor está agora sujeito a novos desafios fiscais e oportunidades de reestruturação.

A Incorporação da Mineração ao Imposto Seletivo (IS)

Uma das principais inovações da Reforma é a criação do Imposto Seletivo (IS), de natureza extrafiscal, com a finalidade de desestimular atividades prejudiciais ao meio ambiente e à saúde pública. A mineração está expressamente incluída como setor sujeito a esse novo tributo, que incidirá sobre a extração e comercialização de bens minerais.

A alíquota do IS para a mineração foi fixada em até 0,25% sobre o valor de mercado dos bens minerais, com base em valores de referência definidos por indicadores oficiais, cotações de bolsas ou metodologia estabelecida pelo Poder Executivo. Trata-se de uma alíquota baixa, mas de incidência direta e não cumulativa, ou seja, sem geração de créditos tributários nas etapas subsequentes da cadeia.

Apesar do desconto de 75% negociado durante a tramitação legislativa, o setor demonstrou forte resistência, especialmente porque o tributo incide inclusive sobre exportações, comprometendo a competitividade internacional — particularmente do minério de ferro, que responde por cerca de 70% das exportações minerais brasileiras.

Aspectos Técnicos do IS na Mineração

Incidência única:
O Imposto Seletivo (IS) incidirá apenas uma vez no ciclo econômico do bem mineral — especificamente no momento da extração ou da comercialização. Essa característica visa evitar cumulatividade e sobreposição de incidência nas diferentes etapas da cadeia. No entanto, ao ser exigido na origem, transfere o ônus integral da tributação à empresa mineradora, que não poderá repassar o tributo ou aproveitá-lo adiante.

Sem crédito fiscal:
Diferentemente do IBS e da CBS, o IS não gera créditos tributários. Isso significa que os valores pagos não poderão ser compensados em etapas posteriores da cadeia de produção ou comercialização. Trata-se, portanto, de um tributo de natureza extrafiscal e finalística, cujo objetivo é desestimular condutas ou setores com impacto ambiental relevante, e não integrar a lógica de neutralidade fiscal do sistema não cumulativo.

Base de cálculo:
A base de cálculo do IS será definida com base no valor de referência de mercado, o que inclui cotações em bolsas de mercadorias, índices oficiais e outras metodologias fixadas por ato normativo do Executivo Federal. No caso da extração de bens minerais, esse valor de referência poderá ser determinado unilateralmente pela União, o que gera risco de arbitrariedade e exige atenção quanto à transparência, previsibilidade e possibilidade de questionamento administrativo e judicial.

Alíquota:
A alíquota máxima do IS sobre a mineração foi fixada em até 0,25%. Embora numericamente modesta, sua incidência direta sobre o valor bruto da operação e sem possibilidade de crédito ou compensação fiscal pode representar efeitos significativos na margem líquida das mineradoras, especialmente nas operações de exportação em que há maior sensibilidade ao custo final.

Abrangência:
O IS abrangerá todos os bens minerais classificados na NCM/SH, incluindo o carvão mineral, citado expressamente na legislação. Importante exceção se aplica ao gás natural, que terá alíquota zero quando utilizado como insumo industrial ou combustível para transporte, desde que haja declaração formal prévia. Caso o uso declarado não se concretize, haverá exigência do imposto com acréscimos legais de multa e juros, o que impõe controles rigorosos na gestão operacional e fiscal das empresas.

Zonas de Livre Comércio:
As Áreas de Livre Comércio (ALC) continuarão com seus benefícios tributários vigentes, conforme previsto no artigo 92-A do ADCT, desde que as operações atendam critérios como a utilização predominante de matérias-primas regionais. Ressalva relevante é feita quanto aos minérios metálicos classificados no Capítulo 26 da NCM/SH, que não poderão contar para fins de predominância regional. Tal restrição limita a utilização de certos minerais nas ALCs e exige reavaliação de estratégias logísticas e contratuais nessas regiões.

Desafios e Oportunidades – Visão Crítica do Setor de Mineração

Pontos Positivos:

Simplificação e racionalização do sistema tributário:
A substituição de cinco tributos (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins) por dois (IBS e CBS), além da criação do IS com finalidade extrafiscal, promete reduzir a complexidade do sistema atual. Isso é particularmente relevante para o setor de mineração, que hoje lida com uma multiplicidade de regimes especiais e disputas federativas. A simplificação tende a diminuir o contencioso e facilitar o planejamento tributário.

Potencial redução do custo de compliance:
Estudos internacionais apontam que o Brasil lidera o ranking de países com maior número de horas dedicadas ao cumprimento de obrigações fiscais. Com a unificação de tributos e a adoção de sistemas eletrônicos padronizados (como o split payment), espera-se uma redução do custo operacional com obrigações acessórias, liberando recursos para áreas estratégicas.

Maior previsibilidade e segurança jurídica no médio e longo prazo:
Com a consolidação normativa da Reforma, projeta-se um ambiente mais estável e menos litigioso, favorecendo investimentos de longo prazo, sobretudo em empreendimentos com maturação prolongada como os da mineração. A centralização na arrecadação e distribuição dos tributos tende a reduzir conflitos federativos sobre competência tributária.

Pontos de Atenção:

Aumento da carga sobre atividades antes desoneradas:
A ampla base de incidência do IBS e CBS elimina diversos benefícios fiscais hoje aplicáveis ao setor, como isenção de PIS/COFINS sobre exportações, diferimentos de ICMS sobre energia e transporte e regimes especiais de ICMS para bens de capital. Na prática, haverá aumento da carga efetiva sobre insumos essenciais, elevando o custo de produção e diminuindo a margem de contribuição do setor.

Incidência fiscal ampla, com efeitos sobre contratos acessórios:
Atividades não diretamente ligadas à extração mineral, como arrendamento de direitos minerários, seguros, licenciamento ambiental, transportes e consultorias técnicas, passam a integrar a base de incidência dos novos tributos. Essa mudança exige revisão dos contratos e reavaliação da precificação, sob pena de erosão financeira por efeitos colaterais da tributação indireta.

Riscos na devolução de créditos acumulados:
Embora exportações permaneçam desoneradas, as empresas terão direito ao ressarcimento de créditos acumulados de IBS e CBS. Contudo, a legislação ainda carece de regulamentação sobre prazos, procedimentos e efetividade desse ressarcimento. Dada a má experiência histórica com créditos de PIS/COFINS e ICMS, há fundado receio de desequilíbrios no fluxo de caixa, afetando inclusive a capacidade de investimento.

Possível perda de competitividade no mercado internacional:
A incidência do IS sobre a extração e exportação de bens minerais, aliada ao aumento dos custos logísticos e operacionais, tende a reduzir a atratividade do produto mineral brasileiro no comércio internacional. Em um mercado altamente sensível a preços e custos marginais, o setor precisará buscar eficiência operacional, inovação e renegociação de contratos para manter sua posição competitiva.

Regime de Transição

A transição para o novo modelo ocorrerá de 2026 a 2033, com aplicação progressiva das novas regras e convivência com o sistema atual. Este período será fundamental para que as mineradoras ajustem seus modelos operacionais, contratuais e financeiros à nova realidade tributária.

Conclusão

A Reforma Tributária de 2025 representa um divisor de águas para o setor de mineração. As alterações no modelo de incidência, a criação do Imposto Seletivo e a nova lógica de tributos sobre o consumo impõem a necessidade de revisão das estratégias fiscais, contratuais e operacionais das empresas do setor.

Mais do que um desafio, trata-se de uma oportunidade para estruturar operações com maior segurança jurídica, eficiência tributária e sustentabilidade regulatória.

Neste contexto de profundas transformações legislativas e fiscais, é fundamental que as empresas do setor mineral estejam amparadas por assessoria jurídica especializada, capaz de interpretar corretamente as novas exigências, avaliar riscos regulatórios e propor soluções estratégicas para otimização da carga tributária e mitigação de impactos. aMoisés Freire Advocacia coloca-se à disposição para assessorar sua empresa nesse processo de transição, oferecendo acompanhamento técnico qualificado, análise jurídica individualizada e suporte completo na adaptação ao novo regime tributário estabelecido pela Reforma.

Sobre o(a) Autor(a)

Fernando de Melo Monteiro Filho

Pós graduado em Direito da Economia e da Empresa pela FGV, pós-graduado em Direito Tributário pela PUC-MG, graduado em Direito pela PUC-MG e em Engenharia Mecânica também pela PUC-MG.

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