O que é o Imposto Seletivo?
Com a promulgação da Emenda Constitucional nº 132/2023 e a Lei Complementar nº 214/2025, o Brasil introduziu o imposto seletivo, um novo tributo com função extrafiscal. Diferente de tributos tradicionais, sua finalidade não é arrecadatória, mas regulatória: incidir sobre bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, desincentivando seu consumo ou produção. Previsto no art. 153, VIII, da Constituição Federal, o imposto seletivo surge como ferramenta de justiça fiscal e sustentabilidade socioambiental.
Fundamentos Legais do Imposto Seletivo
A base legal do imposto seletivo está no novo inciso VIII do art. 153 da CF/88, que exige lei complementar para sua regulamentação. A LC nº 214/2025 cumpre essa função ao definir:
- Os produtos sujeitos à incidência;
- A estrutura de cobrança (regime cumulativo);
- As alíquotas variáveis conforme critérios técnicos;
- A não cumulatividade tradicional é rompida, pois o IS não gera créditos tributários (art. 415, §3º).
Esse modelo aproxima o Brasil de experiências internacionais, como o imposto ecológico europeu.
Transição do IPI ao Imposto Seletivo
O imposto seletivo substituirá gradualmente o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), com um cronograma progressivo até 2033:
- 2026: fase de testes simulados;
- 2027 a 2032: coexistência IS e IPI com alíquotas decrescentes para o IPI;
- 2033: extinção total do IPI, exceto na Zona Franca de Manaus.
Essa transição exige adequações empresariais, sobretudo nos sistemas de compliance e contabilidade fiscal.
Produtos e Serviços Alcançados pelo Imposto Seletivo
Segundo o art. 413 e o Anexo XVII da LC nº 214/2025, o imposto seletivo incidirá sobre bens e serviços com externalidades negativas, como:
1. Veículos, Embarcações e Aeronaves
Alíquotas variam conforme:
- Potência do motor
- Emissões de carbono
- Eficiência energética
- Reciclabilidade dos materiais
- Tecnologias assistivas
2. Cigarros e Derivados de Tabaco
Alíquotas podem atingir até 250%, devido aos altos riscos à saúde pública.
3. Bebidas Alcoólicas
Sistema híbrido de tributação: ad valorem + valor específico por volume.
4. Bebidas Açucaradas
Incidência de até 32%, com base em estudos sanitários.
5. Minérios, Gás e Petróleo
Alíquota simbólica de 0,25% sobre a extração.
6. Loterias e Fantasy Sports
Aguardam regulamentação específica.
Exclusões Polêmicas e Limites Políticos
Apesar da proposta técnica consistente, o imposto seletivo enfrentou resistências políticas. Duas exclusões chamam atenção:
- Armas de fogo e munições: inicialmente incluídas, foram excluídas por pressão legislativa.
- Combustíveis fósseis: retirados do escopo principal e mantidos na CBS e IBS, exceto pela alíquota simbólica de 0,25% na extração de petróleo.
Essas exclusões evidenciam os limites políticos da tributação extrafiscal e revelam que o IS dependerá de ambiente institucional favorável para alcançar sua plenitude.
Estrutura de Cobrança: Como Funciona o Imposto Seletivo?
O imposto seletivo adota um modelo monofásico e cumulativo, com as seguintes características:
- Incide na origem da cadeia (produção ou importação);
- Não permite crédito tributário (sem compensação futura);
- O valor do IS é incluído na base de cálculo do IBS e da CBS, gerando efeito cascata.
A administração do tributo é de responsabilidade da Receita Federal, com aplicação das regras do contencioso administrativo federal (Decreto nº 70.235/1972).
Impactos do Imposto Seletivo nas Empresas
A nova tributação exige reestruturações em vários níveis empresariais:
1. Planejamento Tributário
Empresas devem revisar estruturas societárias e considerar a verticalização produtiva, já que o IS não é compensável.
2. Formação de Preços
O efeito cascata pode impactar a margem de lucro e obrigar repasses ao consumidor.
3. Sistemas e Compliance Fiscal
ERPs e ferramentas fiscais precisam ser atualizados para refletir corretamente a nova obrigação acessória.
4. Responsabilidade Socioambiental
O IS incentiva empresas de setores impactados — bebidas, tabaco, mineração, automotivo — a adotarem inovação limpa e práticas mais sustentáveis.
O IS como Instrumento de Justiça Fiscal e Sustentabilidade
O imposto seletivo inaugura uma nova mentalidade tributária no Brasil: a de usar tributos não apenas para arrecadar, mas para transformar a sociedade. Ele concretiza os seguintes princípios constitucionais:
- Capacidade contributiva diferenciada
- Função social da tributação
- Justiça fiscal e ambiental
Essa mudança reflete uma tendência global de integrar políticas fiscais à agenda ESG (ambiental, social e de governança).
Conclusão: O Futuro do Imposto Seletivo no Brasil
O sucesso do imposto seletivo dependerá de três fatores:
- Qualidade da regulamentação futura;
- Adesão institucional à sua finalidade extrafiscal;
- Capacidade das empresas de se adaptar e inovar.
O IS não é apenas um novo imposto — é um marco regulatório que reposiciona o papel da tributação em um Estado comprometido com o desenvolvimento sustentável, a saúde pública e a dignidade humana.
Dica final: para se manter competitivo nesse novo cenário, empresas, contadores e gestores tributários devem acompanhar atentamente as normas infralegais e buscar assessoria especializada.
Sobre o(a) Autor(a)
Fernando de Melo Monteiro Filho
Pós graduado em Direito da Economia e da Empresa pela FGV, pós-graduado em Direito Tributário pela PUC-MG, graduado em Direito pela PUC-MG e em Engenharia Mecânica também pela PUC-MG.