O Futuro Digital da Advocacia: desafios e oportunidades com o Domicílio Judicial Eletrônico

O universo jurídico brasileiro está passando por um período de transformações profundas, impulsionadas pela implementação do Domicílio Judicial Eletrônico (DJE). Instituído pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) há um ano, o DJE tem como objetivo modernizar e agilizar a comunicação entre o sistema judiciário e as partes envolvidas nos processos. Inicialmente, o DJE abrangeu instituições financeiras, grandes e médias empresas, e até setembro de 2024, pequenas empresas também serão incluídas no sistema, prometendo revolucionar ainda mais a dinâmica do direito no Brasil.

Participação dos Escritórios de Advocacia

Um dos principais pontos de discussão em torno do DJE refere-se ao papel dos escritórios de advocacia neste novo cenário. Historicamente, a comunicação entre o sistema judiciário e os advogados se dava por meio de canais tradicionais como o PJE (Painel dos Advogados), que continua sendo amplamente utilizado. No entanto, o DJE se configura como um ambiente de comunicação direta com as partes, ou seja, com as empresas e até mesmo com pessoas físicas, criando uma camada de interação no processo judicial.

Os escritórios de advocacia, como empresas com seus respectivos CNPJ’s, também podem se cadastrar no DJE. Isso permite que eles tenham acesso direto às comunicações relacionadas aos processos em que atuam. Contudo, na função de representantes legais, a utilização dos meios tradicionais continua sendo plenamente eficaz e preferida por muitos profissionais do direito.

Desafios e Controvérsias

A integração dos escritórios de advocacia ao DJE trouxe algumas controvérsias, principalmente no que diz respeito ao impacto na gestão dos prazos processuais. Com todas as comunicações sendo disponibilizadas no sistema, acessíveis tanto pelos escritórios quanto pelas partes envolvidas, surgiram preocupações sobre a abertura de prazos sem o conhecimento dos advogados responsáveis.

Em resposta a essas preocupações, o CNJ atualizou o DJE para garantir que a contagem dos prazos não seja iniciada pelas partes quando houver advogado cadastrado nos autos do processo. Além disso, o presidente do Conselho, ministro Luís Roberto Barroso, acolheu um pedido da OAB e decidiu suspender o cadastramento compulsório das empresas que ainda não haviam registrado seus CNPJs no prazo anteriormente definido de 30 de maio.

Celeridade e Gestão Processual

O principal fundamento do DJE é a celeridade na comunicação de novas ações, com a necessidade de dar ciência das citações em até três dias úteis. Esta rapidez é vista como um avanço significativo para o sistema judiciário, proporcionando maior eficiência e transparência. No entanto, a gestão dessas comunicações por parte dos advogados das empresas exige uma estratégia processual cuidadosa para evitar conflitos e sobreposição de funções.

A possibilidade de as partes terem acesso direto às intimações, anteriormente destinadas exclusivamente aos advogados, pode resultar em abertura de prazos sem o conhecimento do patrono. Esta questão é sensível e exige uma vigilância constante por parte dos advogados para monitorar todas as caixas de comunicação disponíveis, tanto do CNPJ quanto dos tribunais estaduais, evitando a perda de prazos e garantindo o bom andamento dos processos.

Impacto na Relação Advogado-Cliente

A introdução do DJE também pode alterar a dinâmica da relação entre advogados e clientes. Com o acesso direto às intimações e comunicações processuais, os clientes podem se sentir mais envolvidos e informados sobre o andamento dos seus casos. No entanto, isso também pode gerar ansiedade e a sensação de sobrecarga de informações, exigindo dos advogados uma habilidade adicional na gestão das expectativas e na comunicação com seus clientes.

Os advogados precisarão adaptar suas práticas para garantir que os clientes compreendam corretamente as informações recebidas e saibam que a gestão estratégica do processo continua sendo responsabilidade do advogado. Essa adaptação pode incluir a criação de novos procedimentos internos para revisar e interpretar as comunicações recebidas pelo DJE antes de repassá-las aos clientes.

Segurança da Informação

Outro aspecto crucial do DJE é a segurança da informação. A digitalização das comunicações judiciais aumenta a necessidade de robustez nos sistemas de segurança para proteger dados sensíveis. Escritórios de advocacia precisarão investir em infraestrutura tecnológica adequada, além de treinar suas equipes para garantir que as informações processuais sejam manuseadas de forma segura e conforme a legislação vigente, como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

Perspectivas Futuras

As mudanças trazidas pelo DJE ainda estão em fase de ajustes, e muitas outras transformações são esperadas. A atenção dos advogados e das empresas será crucial para navegar por esta nova fase do sistema judicial brasileiro. É necessário distinguir claramente os papéis de cada um para assegurar que as funções dos escritórios de advocacia não sejam sobrepostas pelas empresas, mantendo a integridade e a eficiência do processo judicial.

Em resumo, o Domicílio Judicial Eletrônico representa um avanço significativo para a modernização do sistema judiciário brasileiro, trazendo desafios e oportunidades para os escritórios de advocacia. A adaptação a essas mudanças e a vigilância constante serão essenciais para garantir que os benefícios da celeridade e da transparência sejam plenamente aproveitados, sem comprometer a eficácia da atuação dos profissionais do direito. A modernização do sistema judicial é um caminho sem volta, e os escritórios de advocacia precisam estar preparados para essa nova realidade, garantindo a qualidade dos serviços prestados e a satisfação de seus clientes em um ambiente cada vez mais digital.

Sobre o(a) Autor(a)

Lucas Felipe Jardim de Medeiros

Graduando em Direito, cursando atualmente o 10º período pela Faculdade Mineira de Direito - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas).

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